Quatro colunas


por Aura, Midríase, Sentinela e Sola

Pregações

Dos três dias da semana em que ia visitar sua mãe, encontrou-a sentada ao sofá, mais suspeita que o normal. No quarto, abençoado por uma pintura pendurada na parede de um Jesus crucificado, estava um martelo em cima da cômoda ao lado da cama. A gaveta da cômoda estava fechada, trancada, com muitos pregos descuidadosamente fixados nas bordas. A mãe avisou:

— É o seguinte: essa gaveta não irá abrir até eu morrer. Quando eu morrer, avise o Seu Zé sobre essa gaveta para que ele a abra.

Visitando sua irmã, disse sobre a gaveta pregada, de como a mãe havia novamente tido um de seus episódios incompreensíveis e erráticos, de como era difícil lidar com ela. Não sabia dizer o que de tão importante estava dentro daquela gaveta. Por diversas idas à casa da mãe e da irmã, o incômodo da gaveta pregada voltava como um fantasma. O que sua mãe escondeu dentro dessa gaveta era um mistério, o qual não podia (mesmo querendo) desvendar.

Continuou remoendo o mistério até o fim da vida.

A irmã, agora a única responsável de visitar sua mãe uma vez por semana, observava a gaveta de que seu irmão tanto falava. Eventualmente, a mãe chegou ao fim da vida e, como também já não havia um Seu Zé a recorrer, a irmã abriu a gaveta com os próprios punhos. Queria fazer justiça ao irmão que tanto sofreu por não saber o que tinha na gaveta pregada.

Nada havia na gaveta pregada. A irmã ficou incrédula, raivosa: “A mãe matou ele por causa dessa gaveta!”. Não conseguia entender, encontrar uma explicação para a mãe ter guardado, com tanto segredo, nada de seu irmão.

Continuará sem explicações até o fim da vida.