(Espaço para o título)
Queria pedir desculpa por não cumprir o compromisso. Queria pedir desculpa a alguém (ou a você), que supostamente nos acompanha semanal e diariamente. Queria pedir desculpa aos meus amigos. Uma coluna em falta atrapalha a estrutura… Mas tanto faz!
Esqueci, ignorei, esqueci, ignorei… De algum modo, sempre negando. Minha relação com a escrita é complicada. E, sinceramente, eu estou farta de dizer isso. Uma inconha! (Penso, sem muita certeza do significado, mas apostando na força da expressão.). Claro, não me aguentei, fui pesquisar o significado (mas me comprometi comigo mesma que deixaria assim, independente do que descobrisse). De acordo com o dicionário, inconha é algo com um lado muito unido a outro. Sinceramente, depois dessa, a minha vontade é até de parar de escrever.
Estou ouvindo minha pequena vizinha com a mãe, aprendendo a formar as sílabas. Inclusive, a menina tem o mesmo nome que o meu. Juntou as letras e questionou à mãe: “Eu tô aprendendo a ler?!”. Após a confirmação da mãe, soltou um grito eufórico. Rs As letras ainda não fazem tanto sentido, mas ela acredita no que ainda vão significar. A mãe aposta, a professora aposta e ela confia e aguarda ansiosamente.
Meu outro vizinho começou a cantar seu rock, alto, exaltado, fumaça subindo e entrando aqui na janela. Não tenho certeza se está cantando certo, porque é inglês. Ah, o inglês… Quando comecei a ter aula de inglês na escola, percebi que tinha facilidade para aprender. Mas não desenvolvi muito, dei prioridade para outras coisas. Hoje tenho bastante vontade de aprender mais, não só o inglês. Começo e recomeço o “duolinguo”, fico animada, mas logo paro. No fundo, eu acho que tem um desejo de não aprender. Aprender tira um pouco da magia das coisas e é sempre uma luta, porque eu gosto da magia, mas sou muito curiosa. Eu gosto muito de ouvir músicas em outras línguas, principalmente porque não entendo exatamente o que está sendo dito. Então curto o som e viajo no significado, de um jeito diferente da música puramente instrumental, que também amo. Algumas vou atrás do significado e, se faz algum sentido e concordo, entra para o meu repertório de voz e violão. Do contrário, fica só para os meus ouvidos.
Essas divagações me fazem entrar em uma outra questão que ainda é na mesma linha, mas se complexifica mais. Só de começar a pensar em escrever, já me deu uma certa preguiça… Rs. Minha escrita é narcísica e acho que eu fico cheia de mim, ao mesmo tempo que vazia. A preguiça parece ser de sustentar um texto talvez desinteressante. Eu paro e me pergunto: para que estou fazendo isso? É só ego? Isso me deixa mal. Para variar, a luta constante de mim e eu. Mas que inconha, né? Tem essa cola no outro… Grande Outro! Separações são difíceis, mas uniões também.
Lembrei da vizinha de antes, aprendendo a unir as letrinhas… É surreal pensar que um dia não soube escrever! Parece que não é possível pensar mais sem a influência desse conhecimento. Minha relação com a escrita é complexa e toca em muitos pontos. Mas a partir do momento em que me inseri na Academia, se complexificou mais. Basicamente porque me parece que a única forma de comunicação lá é escrevendo. Isso é tão forte que, geralmente, até nas comunicações orais os textos são previamente escritos. Aulas são amparadas nos slides. Não tem muito espaço para a fala livre… E se um professor segue por aí, ele vai ser conhecido por sempre abrir parênteses e a fama provavelmente vai pra linha do confuso (eu mesma pensava isso de alguns). Isso foi me deixando sem voz, sem lugar… Minha curiosidade foi se escondendo, não à toa me envolvi muito com música nesse meio. Nem que precisasse inventar o espaço! Minha impressão era e acho que em alguma medida ainda seja que não importava toda a formação rica que eu tive naquele espaço e fora dele, se não escrevesse, não tinha muito valor. E não estou de tudo errada. Não concordo, mas é verdade que é uma realidade nesse meio. Maluca que sou, não contente, fui me meter em fazer mestrado e aí isso tudo se intensificou. Obviamente não dei conta daquela escrita e fui caçar um meio de contar de outro jeito. Paralelo a isso, mas em consequência dessa trava, foram surgindo outros meios de escrever. Uma certa escrita mais poética, nascida da angústia. Uma surpresa! Estava gostando das outras coisas que escrevia. A sensação é que brota. De repente, mas não tão de repente, brotava, de uma imagem, uma cena, uma situação.
Nesse processo todo, criei uma repulsa com a escrita (principalmente a acadêmica), mas também um desejo por escrever. Assunto para outro momento, mas cheguei a aceitar, com muito custo, que aquele podia ser meu último estágio acadêmico. Parar como mestre parece simbólico. Eu posso (originalmente eu pensei “poderia”) parar na academia e seguir curiosa.
A vontade de criar esse espaço do “4Colunas”, do modo como é configurado, foi uma resposta a essa minha sensação de ter sido tirada minha possibilidade de escrita. Tudo um rolo entre mim e eu, rs, mas foi o que senti. Algo como “ok, não sirvo para escrever lá, daquele jeito, mas posso escrever como eu quero, falar o que eu quero, mas com a licença poética de não me revelar (ainda que constantemente me revelando)”. Fantasiei, para lidar com minha frustração com a qualidade da minha dissertação (que deveria, mas ainda não foi entregue), que se eu quisesse, poderia escrever livros e mais livros, sem as amarras da academia. Quem sabe não viro escritora? Quem sabe não viro colunista? Rs
A verdade é que eu quero falar, colocar minha voz, meu olhar, minha escuta, o que sinto na pele, quero também atenção. Apesar das crises existenciais, que hoje são mais maduras, sou encantada com a existência, o universo e até mesmo a linguagem. Tudo me parece muito incrível e a vida é poesia concreta. Mas me frustro por não conseguir dizer. Rsrs Ora, ora…
Acabou que não entrei na outra questão que mencionei antes, mas era sobre ser artista. Algo que desde muito nova escuto sobre mim: “essa menina é artista!”. E essa outra questão é gigante, porque ainda que fique feliz com a referência, ainda que em alguma medida aceito, não me sinto digna do título. E com o tempo e pesquisas, já vi que essa não é uma questão tão particular, parece até comum o sentimento. Mas entra em uma certa cobrança interna e até por conta de um endeusamento do artista, pela grandiosidade de sua obra. Pra mim, sinto que vivo artisticamente, tenho uma sensibilidade aflorada, é leve e intenso, mas minha frustração é que sinto que nunca tenho produto. Parece que não produzo arte (e nem estou entrando no ponto da comercialização). Rs Não faço arte, não posso ser artista; não escrevo, não posso ser acadêmica. Estou sendo radical, eu sei. Mas é um caminho que ainda estou descobrindo.
Sobre escrever, talvez dê conta de escrever mais e solte essa inconha. Quem sabe um livro um dia se construa? Rs Mas posso também descobrir que posso continuar a viver sem escrever, que tudo bem, isso não me torna uma pedra oca. No fundo (e na beira) é isso: passei a olhar pra mim com desprezo por não dar conta de escrever bem (seja acadêmica ou poeticamente).
Já me cansei de escrever por hoje, ainda que queira falar mais. Não revisarei o texto.
Ps.: Apesar do meu descontentamento com a academia, viva a ciência! Mas ainda que não seja um lugar para mim, de fato precisa de mudanças estruturais. Estrutura muito enrijecida começa a trincar. Apostemos nas frestas!
Para o “Ouça” de hoje me veio “Esquadros”, de Adriana Calcanhotto. Aproveita e ouça também outras duas composições/interpretações dela: “Metade” e “Traduzir-se”.
