Detalhes da arte
Era hipnotizado todas às quintas-feiras com a história da arte, última aula do dia atribulado de um cursinho pré-vestibular. O professor tinha traços de ator, o qual apontava para os traços das pinturas. Romantismo, modernismo e contemporâneo; ele ficava fascinado com as esculturas e obras que exibia para turma. Divertido ator, um artista-transmissor. As vísceras estavam na projeção da sala de aula: “Observe a genialidade desse pintor!”. O furor do professor, para mim, brilhava mais do que ele tentava apresentar.
Em uma aula, apresentava as obras de Jackson Pollock e seu estilo de pintura. A forma de despejar a tinta pelo quadro branco (o “gotejamento”) enquanto andava, um exercício de espaço e domínio sobre suas próprias intenções. Como o professor, fiquei fascinado. Ao olhar para minha fascinação, desafiou-se em arrancar mais do menino seco e quis saber mais: “o que você acha desse quadro?”. Parei, observei, engasguei. “A técnica dele, a forma que ele cria o quadro, me impressiona”. Um pouco cabisbaixo, decepcionado por ouvir quase uma repetição do que havia acabado de dizer, o professor me respondeu intencionando querer ter ouvido outra coisa: “entendo o que quer dizer”.
Em uma excursão para um museu com a mesma turma, me desafiei a tentar “interpretar” uma obra de arte, o que ela diz. Escolhi um quadro, parei na frente dele e o observei atentamente. Cada elemento foi por mim inspecionado: os humanos representados, os anjos em um espaço que poderia ser o reino dos céus, um mar de fogo que caía pelas montanhas no canto inferior esquerdo, um tom de gospel, a sombra do relevo da tinta, a moldura grotesca, o contexto histórico, as pinturas ao lado esquerdo e direito, o próprio nome da obra e como as pessoas na sala olhavam para ele. Eram os detalhes, acreditava, que fabricava o fascínio do professor pela arte, que dava o tesão. Procurei, procurei, minutos atrás de minutos, enfim, parado em frente a uma pintura cheia de detalhes. Tinha detalhes, definitivamente.
Descobri um tempo depois que, nessa matéria, não há tempo suficiente para se preocupar com detalhes.
