Quatro colunas


por Aura, Midríase, Sentinela e Sola

A festa e a prece

Era uma terça-feira de carnaval. Eu me lembro muito bem: o dia estava ensolarado e aquele azul do céu se misturava generoso ao calor que brotava dos paralelepípedos no chão. A data era o prenúncio para aquele desejo ser, finalmente, tomado como realidade. Era carnaval, afinal. Como boa foliã que nunca fui, eu sabia exatamente o que eu deveria fazer. Ou, o que eu achava que deveria fazer.

O cenário em festa era propício e a fantasia dava o tom: mesmo tendo passado a vida à espreita, como uma hóspede que aceita tudo de bom grado, aquele era o momento de revirar a história e ser a porta bandeira do próprio coração. E em meio à apoteose, seguindo aquele bloco do querer, não fui capaz de continuar. Coloquei a máscara da boa menina. Joguei, tal qual a criança que brincava com confetes ao meu lado, meia dúzia de palavras no ar - em um ato herege - proferindo uma oração. Quem dera se ele tivesse atendido.

Não sei até hoje se foi obra do pecado ou do destino. De ambos. Ou nenhum. A oração não foi atendida; a realidade permanece límpida e aquele ciclo, intacto, até hoje, numa outra terça-feira de carnaval ensolarada.